Sínodo da família, dia 6: pastoral da misericórdia para as famílias machucadas.
O cardeal Erdö apresenta a relatio post disceptationem, que sintetiza a participação dos 180 membros do sínodo na primeira semana de trabalho.
Por Salvatore Cernuzio
CIDADE DO VATICANO, 14 de Outubro de 2014
(Zenit.org) - Fazer opções pastorais valentes: os 180 cardeais, bispos,
auditores e especialistas do sínodo extraordinário sobre a família estão de
acordo com este ponto. E a "relatio post disceptationem", lida nesta
segunda-feira pelo cardeal Peter Erdö, relator geral, reafirma a fidelidade da
Igreja ao evangelho, mas sem que falte uma atenção particular às fragilidades
familiares.
Ao chegar a esta fase, o sínodo se concentra na
misericórdia e na urgência atual de novos caminhos pastorais, porque as
dificuldades das famílias "têm sido mais 'sofridas' do que escolhidas em
plena liberdade".
O debate ainda está em processo: a relatio é
uma síntese das discussões das congregações gerais na primeira semana do
encontro. O cardeal Erdö deu a entender que, para as decisões mais concretas, é
necessário esperar até o dia 19 de outubro, depois das discussões dos “circuli
minores”, ou círculos menores, que começaram na sexta-feira à tarde e
continuarão durante toda esta semana. Portanto, não se pode esperar um
retumbante "sim" ou "não" à possibilidade de acesso aos
sacramentos para pessoas em situações anômalas, como a dos divorciados
recasados.
“Não é sábio pensar em soluções únicas ou
inspiradas na lógica do tudo ou nada”, disse Erdö. Sobre este assunto, existem
duas linhas: “Alguns argumentaram a favor da disciplina atual, em virtude do
seu fundamento teológico; outros se expressaram em prol de uma abertura maior
às condições particulares, às situações que não podem ser desfeitas sem que se
determinem novas injustiças e sofrimentos”.
A “novidade” é uma proposta, feita por alguns,
de que "o eventual acesso aos sacramentos seja precedido de um caminho
penitencial, sob a responsabilidade do bispo diocesano, e com um compromisso
claro em favor dos filhos". Para Erdö, seria uma possibilidade não
generalizada, fruto de um discernimento caso a caso, feito gradualmente,
distinguindo-se entre o estado de pecado, o estado de graça e as circunstâncias
atenuantes.
Os critérios dos padres sinodais para trabalhar
estas questões delicadas são três: escuta, olhar fixo em Cristo e discernimento
"à luz do Senhor Jesus". A Igreja, "casa paterna" e
"tocha em meio às pessoas", tem o trabalho de acompanhar com
paciência, delicadeza, atenção e cuidado os seus filhos mais frágeis,
"marcados pelo amor ferido e perdido".
Reconhece-se assim a necessidade de "uma
palavra de esperança e de sentido" para estas pessoas, acolhendo-as com a
sua existência concreta, sabendo-se "sustentar a busca, alentar o desejo
de Deus e a vontade de fazer parte da Igreja plenamente, inclusive por parte de
quem experimentou o fracasso ou está nas situações mais desesperadas".
Nesta linha, pede-se um discernimento
espiritual "sobre as convivências, os casamentos civis e os divorciados
recasados", porque "compete à Igreja reconhecer estas ‘sementes do
Verbo’ dispersas para além dos seus confins visíveis e sacramentais".
"A Igreja se volta com respeito àqueles
que participam da sua vida de modo incompleto e imperfeito, apreciando mais os
valores positivos que eles guardam do que os seus limites e faltas".
Além de "curar as feridas" dos
divorciados recasados, a Igreja é chamada também a acolher as pessoas
homossexuais que "têm dons e qualidades para oferecer à comunidade
cristã". A questão homossexual "nos interpela a uma reflexão séria
sobre como elaborar caminhos realistas de crescimento afetivo e de maturidade
humana e evangélica, integrando a dimensão sexual". Não fica nenhuma
dúvida no ar quanto ao fato de que "as uniões entre pessoas do mesmo sexo
não podem ser equiparadas ao matrimônio entre um homem e uma mulher".
Também "não é aceitável que se queiram exercer pressões sobre a atitude
dos pastores ou que organismos internacionais condicionem ajudas financeiras à
adoção de normas inspiradas pela ideologia de gênero". A Igreja, afirma a
relatio, presta atenção especial às crianças que vivem com casais do mesmo
sexo, reiterando que, em primeiro lugar, devem estar sempre as exigências e os
direitos dos pequenos.
E pensando sempre nos pequenos, os padres
sinodais invocam no documento o "respeito e amor" por cada família
ferida, em especial por quem sofreu injustamente o abandono do cônjuge,
evitando "atitudes discriminatórias" para com as crianças. "É
indispensável encarar de maneira leal e construtiva as consequências da
separação e do divórcio; os filhos não podem se tornar 'objetos' de briga;
devem-se buscar as melhores formas para que eles possam superar o trauma da
divisão familiar e crescer do modo mais sereno possível".
Os participantes do sínodo enfatizam a
necessidade de uma "preparação adequada para o matrimônio cristão",
que não é só "uma tradição cultural ou uma exigência social", mas
"uma decisão vocacional". Não deve haver uma "complicação"
dos ciclos de formação, mas um "aprofundamento", indo-se além de
orientações gerais. Neste sentido, deve-se renovar também "a formação dos
presbíteros" através de um envolvimento maior das famílias,
"privilegiando o seu testemunho". Do mesmo modo, os casais devem ser
acompanhados mesmo depois da celebração do matrimônio: um período "vital e
delicado", cheio de alegrias, mas também de desafios que a Igreja deve
ajudar os cônjuges a enfrentar.
Abordou-se também a simplificação dos
procedimentos de reconhecimento da nulidade matrimonial. Entre as propostas,
foram apontadas a superação da necessidade da dupla sentença de conformidade, a
possibilidade de se determinar uma via administrativa sob a responsabilidade do
bispo diocesano e um processo sumário a se realizar nos casos de nulidade
notória. Também foi proposta a possibilidade de se dar relevância à fé dos
noivos na avaliação da validade ou não do sacramento do matrimônio. Deve-se
destacar que, em todos os casos, a questão é estabelecer a verdade sobre a
validade do vínculo. Também se pede o aumento da responsabilidade do bispo
diocesano, que, na sua diocese, poderia nomear um sacerdote devidamente
preparado para aconselhar gratuitamente as partes sobre a validade do
matrimônio.
Quanto aos leigos, o sínodo incentiva o seu
compromisso no âmbito cultural e sócio-político para que fatores externos não
obstaculizem a "autêntica vida familiar, determinando discriminações,
pobreza, exclusões e violência". Não por acaso, o tema escolhido pelo papa
para o próximo sínodo ordinário, de 4 a 25 de outubro de 2015, é "a
vocação e a missão da família na Igreja no mundo contemporâneo". O tema
foi anunciado nesta segunda-feira pelo cardeal Lorenzo Baldisseri, secretário
geral do sínodo, na abertura dos trabalhos e em presença do papa Francisco.
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