quinta-feira, 26 de março de 2015

CRUCIFICAR A COBRA

Desde muito jovem entendi que a cobra era um problema para nós que saíamos descalços para o trabalho. Lembro-me quando o meu irmão Afonso foi picado por uma jararaca o quanto que o papai teve que correr até na cidade próxima para conseguir o soro antiofídico e assim evitar maiores danos a sua integridade física. Além disso, lembro-me das dores horríveis que ele sentia e o pavor posterior que sentia diante de qualquer cobra que visse.
Atualmente, entendo que a cobra é um animal que integra a pirâmide da vida e foi pensada e querida pelo Criador. É absolutamente claro que ela não é perigosa, a não ser que nós ameacemos o seu habitat e a sua vida. Ela apenas cumpre a sua função e procura defender a sua casa quando alguém a ameaça.  Portanto, não estamos tratando de cobras, animais que se alimentam, sobretudo, de ratos e outros seres vivos. 
Quero falar de uma cobra muito mais perigosa do que a jararaca, o coral e outras. Estou ensaiando uma fala sobre a nossa língua, que é muito perigosa quando se afasta do seu Criador. Vejamos um exemplo que está nas primeiras paginas da Sagrada Escritura. O episódio de Adão e Eva após terrem pecado, ou seja, se afastado de Deus. Adão usa sua língua, que foi pensada para o louvor a Deus e a edificar os irmãos, agora é utilizada para culpabilizar a mulher e a Deus, que colocou a mulher ao seu lado.
Vamos acompanhar o povo de Israel na travessia do deserto rumo à terra prometida. O percurso é longo e as dificuldades não são pequenas. Falta água, falta carne e o cansaço aumenta. Na liderança dessa travessia está Deus e os seus servos, especialmente Moisés. Diante das dificuldades próprias da vida o povo soltou a língua, ou seja a cobra, e começou a murmurar e falar mal de Deus e dos seus servos. Esses pensamentos e falas mordiam o próprio povo e foram se machucando e muitos morriam com isso. Qual é a solução apontada por Deus? Crucificar a língua fofoqueira, maldizente, mentirosa e deixar-nos atrair pelas coisas do alto (cf Nm 21,4-9).
Uma vez que se coloca essa orientação divina em prática, as fofocas e mentiras cessam, as energias são canalizadas para alavancar a caminhada e todos podem seguir rumo à terra prometida, apesar das dificuldades e contratempos, que são próprios da vida humana. Com isso, cada um entende a sua missão e passa a louvar a Deus e respeitar os seus servos que conduzem o povo para o Céu.
Queridos leitores! Uma vez que estamos a caminho, percorramos a Palavra de Deus e cheguemos ao Evangelho de João (Jo 8,21-30). Nele encontramos Jesus discutindo com os fariseus que estão longe do Deus do Amor e se agarram as suas leis humanas e as coisas da terra. Por conta disso, não querem e não conseguem acolher o ensinamento dele, que vive em comunhão com o Pai. Pelo contrário, soltam a cobra mentirosa e falam mal de Jesus e dos seus seguidores, além disso, planejam o seu assassinato.
Diante disso, Jesus aponta para o caminho mais uma vez. Já que eles não querem e não conseguem crucificar a mentira e o pecado, para viver a fraternidade, num gesto de amor estremado, ele se apresenta disposto a carregar e a crucificar, na sua pessoa, essa serpente enganadora e pecaminosa que reivindica espaço dentro de cada um de nós. Por isso ele afirma: “Quando tiverdes elevado o Filho do Homem, então sabereis que eu sou, e que nada faço por mim mesmo, mas apenas faço aquilo que o meu Pai me ensinou. Aquele que me enviou está comigo. Ele não me deixou sozinho, porque sempre faço aquilo que é do seu agrado” (Jo 8,28-29).
Diante do crucifixo vamos olhar bem para Ele. Ele crucificou a serpente enganadora de cada um dos seus irmãos. Portanto, não somos mais escravos da nossa língua maldizente, fofoqueira e pecaminosa, a não ser que andemos longe de Deus como ocorria com os fariseus. Uma vez que fazemos experiência da pessoa de Jesus e nos encantamos com ele seremos capazes de crucificar a nossa língua venenosa, que, com suas mentiras, consegue matar a alegria da vida familiar e comunitária, além de envenenar a nós mesmos.

Queridos irmãos! Nesta Semana Santa, que em breve viveremos, Jesus quer atrair todos nós para o Alto. Ele já crucificou a cobra mentirosa e enganadora por todos nós. Peçamos a graça de viver em comunhão com ele e assim podermos crucificar a nossa língua maldizente para ressuscitar com ele para uma vida nova. Uma vida cheia de amor e respeito para com Deus e para com os irmãos. Para uma Feliz Páscoa. 





Pe. Arlindo Toneta  -  MI
Pároco da Paróquia N. Sra. da Boa Esperança  - Pinhais - PR

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